Polémica: Bolseiros de investigação insatisfeitos
In Diário de Notícias, 19 de Julho 2002
Os bolseiros de investigação científica estão insatisfeitos com a sua situação. Queixam-se de ser “mão de obra barata” e de não ter regalias de segurança social compatíveis com a sua actividade nas instituições de investigação. Organizados numa plataforma de bolseiros, elaboraram um documento reivindicativo que vão levar à comissão parlamentar competente na terça-feira. Para já, diz o investigador-bolseiro João Ferreira, há “sinais preocupantes” na política de ciência do novo executivo. E aponta a extinção anunciada de vários institutos públicos como o mais negativo. Mas não é tudo. Depois de terem solicitado uma audiência ao novo ministro da Ciência e do Ensino Superior, Pedro Lynce, os bolseiros foram remetidos para o presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).
“Isto foi há cerca de um mês e ainda não obtivemos resposta”, disse à Agência Lusa, João Ferreira, investigador do Jardim Botânico da Universidade de Lisboa, e um dos bolseiros que integra a plataforma.
Desde Novembro de 2001 que 70 bolseiros de investigação científica se uniram nas críticas ao estatuto que orienta a sua actividade, reclamando mais condições sociais e de trabalho. É nesse sentido que se apresentam na terça-feira perante a Comissão parlamentar de Educação, Ciência e Cultura.
Direito a melhores regalias de segurança social, bolsas equiparadas a ordenados de técnicos com habilitações semelhantes e revisão do papel do bolseiro nas instituições são algumas das principais reivindicações.
“Começámos por pedir audiências aos grupos parlamentares e obtivémos resposta de todos”, disse João Ferreira, indicando que falta ainda o encontro com o grupo do Partido Social Democrata (PSD). A data proposta para o encontro coincidia com uma outra previamente marcada para outro grupo parlamentar, pelo que a reunião foi adiada, estando ainda por estabelecer a data alternativa, explicou o biólogo.
“Da parte do anterior executivo houve sempre bastante abertura para ouvir os bolseiros, nomeadamente por parte da FCT, mas os problemas não se resolveram”, diz João Ferreira. Considera, aliás, que uma das bandeiras do antigo Ministério da Ciência e da Tecnologia (MCT) de Mariano Gago, a formação avançada de recursos humanos, acabou por servir para agravar ainda mais a situação dos bolseiros.
“Para aumentar o número de bolseiros, provocou-se um decréscimo do valor da bolsa e acentuou-se o problema da condição de bolseiro”, sublinha, concluindo que as falhas do sistema acabaram por se agravar.
Uma das medidas do anterior executivo foi a criação do Estatuto do Bolseiro de Investigação Científica (EBIC), que é, no entanto, omisso e ambíguo relativamente a muitos dos direitos e deveres dos bolseiros, levando a situações de ilegalidade e precariedade laboral, segundo o investigador.
“Não só é insuficiente em vários pontos, como não é cumprido em várias instituições”.
O vínculo como bolseiro a uma instituição pode ir até dez anos, variando conforme o grau de pós-graduação a que o bolseiro se candidata.
As principais reivindicações contidas no documento a apresentar terça-feira são o direito à segurança social com integração no regime geral, o reconhecimento legal do direito a férias e o direito ao subsídio de desemprego.
Além disso, é pedida a progressiva equiparação do montante das bolsas às remunerações dos trabalhadores com habilitações equiparadas.
Equiparação aos restantes trabalhadores no usufruto de todos os subsídios estabelecidos por lei, contagem do período de duração da bolsa para efeitos de reforma e concursos públicos, alteração do regime de exclusividade, fiscalização regular pelas entidades competentes e novas vagas nas carreiras, para a integração contínua e progressiva de pessoal com vários níveis de habilitações, são outras reivindicações.
No fim de 2001 estavam em curso 3400 bolsas concedidas directamente pela FCT, na sequência da aprovação de candidaturas individuais apresentadas em concursos públicos.