Ainda o DL57/2016
A aprovação recente do Decreto-Lei 57/2016 (DL) introduz um novo quadro legal para a contratação de doutorados. Este quadro é especialmente relevante por introduzir um mecanismo de passagem de bolsas a contratos, o Art.23º, a norma transitória. Havendo formalização de tal mecanismo, será a primeira vez que é consubstanciada em lei uma intervenção direta sobre a injustiça a que o vínculo de bolsa corresponde para grande parte dos atuais investigadores.
Na atual versão do diploma, o quadro estabelecido para a contratação de doutorados continua a ser muito limitado, desde logo no universo de possíveis contratados. Ao aplicar o diploma apenas a doutorados e dirigindo-o particularmente aos que o sejam há mais de 3 anos, o Governo insiste em separar na lei o que nos locais de trabalho não se distingue senão pela experiência. O Governo desvaloriza assim milhares de investigadores que continuarão a ver-se forçados a realizar trabalho científico com condições muito precárias, desde logo no vínculo ao mantê-los sob o Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI).
Por outro lado, mesmo para os abrangidos pelo DL a precariedade será uma condição bem presente. Tal como antes, as renovações são por um ano, até ao máximo de 6 anos para a totalidade do contrato. E depois? Depois temos o vazio, como que fosse normal contar com a perpetuação de medidas paliativas avulsas. É muito mau sinal o facto de o Governo ter escolhido não integrar este quadro de contratação de doutorados no âmbito do Estatuto da Carreira de Investigação Científica, mas ao invés ter mais uma vez apostado numa velada carreira precária paralela.
Chamamos ainda a atenção para as muitas dúvidas que subsistem sobre a aplicação do diploma, encontrando-se interpretações diferentes nas instituições. Tais incongruências devem ser desfeitas, desde logo quando parece que algumas instituições pretendem aplicar a norma transitória o quanto antes enquanto outras procuram adiar a sua implementação.
Apesar disto, a possibilidade criada pelo DL de contratar vários dos atuais bolseiros pós-doutorados deve ser aproveitada. Apelamos a todos os bolseiros doutorados que se mobilizem no sentido de exigir a sua contratação pelas instituições, em particular os que possam estar ao abrigo da norma transitória.
A ABIC está a organizar reuniões plenárias de bolseiros onde discutiremos todas as questões associadas ao DL e onde promoveremos ações no sentido da contratação dos bolseiros.
Nesta altura em que se discute o OE para 2017, em que se prevê a apreciação parlamentar do DL e em que a ABIC está a reunir com os grupos parlamentares, é de realçar que este diploma nunca poderá ser um significativo elemento de combate à precariedade (até porque deixa de fora todos os bolseiros não doutorados e alguns doutorados) sem serem cumpridas as 3 seguintes mudanças:
— Associar uma limitação do número de contratos a prazo com uma perspetiva real de estabilização e integração em carreira;
— Revogar o EBI, uma vez que ele entra em contradição com este diploma;
— Incrementar o financiamento disponível para contratações, não apenas o orçamentado mas acima de tudo o efetivamente executado.