A Associação dos Bolseiros de Investigação Científica reuniu, em 10 de Janeiro de 2022, com o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor. Nesta reunião abordaram-se questões relativas às bolsas excepcionais e às sucessivas recusas por parte da FCT em esclarecer os bolseiros a respeito desse processo – bem como em reunir com a ABIC para discutir o tema –, a ausência de medidas da tutela para o fim das taxas de entrega de tese em sede de Orçamento do Estado, conforme fora prometido em Junho de 2021, assim como outros temas que afectam a vida e o trabalho dos bolseiros.
1) Bolsas excepcionais
- Sobre a possibilidade de um bolseiro poder trabalhar enquanto aguarda pela resposta ao pedido de bolsa excepcional. Durante os últimos meses têm chegado denúncias à ABIC sobre a impossibilidade, enunciada pela FCT, de pessoas que concluem as suas bolsas mas que ainda não têm resposta ao seu requerimento, poderem exercer outra actividade remunerada, sob pena de violação do regime de dedicação exclusiva em caso de parecer favorável. O Ministro Manuel Heitor considera que esta impossibilidade é administrativa e pode ser contornada através do adiamento do início da bolsa excepcional, à semelhança do que sucede com o Concurso para Bolsas de Doutoramento. Apesar do número 2 do artigo 3.º do Regulamento de Bolsas Excepcionais, no qual a FCT se apoia para sustentar a aparente incompatibilidade, o Ministro comprometeu-se em indicar à FCT para que haja lugar ao adiamento do início da bolsa excepcional nestes casos. A ABIC referiu que este adiamento, ainda que necessário, não pode significar um maior atraso na notificação dos pareceres e que esta realidade deveria ter sido antecipada e, sobretudo, encarada com grande preocupação e responsabilidade. Além disso, vem confirmar que a burocratização do processo poderia ter sido evitada com uma prorrogação automática, conforme reivindicado pelos bolseiros.
- Sobre a demora na notificação dos resultados dos requerimentos e data prevista para a conclusão definitiva de todo o processo. A ABIC insistiu na necessidade de que este processo tenha o seu fim rapidamente, que seja divulgado um prazo claro para a divulgação dos resultados ainda em falta e que a FCT o cumpra. O Ministro indicou que, aplicado o artigo 128.º do Código do Procedimento Administrativo, a FCT cumprirá o prazo máximo estipulado. Não obstante, irá pedir uma data mais específica à FCT, fazendo por garantir que os bolseiros recebem a notificação com o mínimo de três meses antes do término da sua bolsa de doutoramento. Reforçando a necessidade de ser estipulada uma data para a concretização de um processo que se arrasta há quase um ano (aquando do início do período de confinamento em Janeiro de 2021), a ABIC aguardará, expectante, uma resposta definitiva e célere a esta questão.
- Sobre a demora das instituições na entrega de documentos necessários à contratualização. Tendo chegado à ABIC denúncias acerca de atrasos na entrega de documentos necessários para a contratualização das bolsas excepcionais, foi pedido ao Ministro Manuel Heitor que interpelasse os reitores com vista à rápida resolução de um problema não imputável ao bolseiro. Além disso, a ABIC relembrou que, de acordo com o número 3 do artigo 5.º do Regulamento de Bolsas Excepcionais, os documentos exigidos pela FCT já estão maioritariamente em posse da instituição e que os documentos necessários são enquadráveis no processo de renovação da bolsa. Deste modo, à semelhança do que sucede nos processos de renovação, consideramos que o contrato de bolsa excepcional deve ter efeitos imediatos, podendo o bolseiro entregar posteriormente qualquer documento em falta por razão que não lhe seja imputável. Estando a Universidade de Aveiro já identificada como uma instituição em que este entrave está a ocorrer, o Ministro Manuel Heitor comprometeu-se em contactar o respectivo Reitor. Ficou acordado que, caso o problema suceda noutras instituições, a ABIC reportá-las-á junto do MCTES, para que os bolseiros não fiquem ainda mais prejudicados. A ABIC exorta os bolseiros que tenham obtido bolsa excepcional e que estejam com problemas na obtenção de documentos nas suas instituições a que nos dêem conhecimento dessa situação, para que a façamos chegar ao MCTES.
- Sobre as recusas de bolsas excepcionais para bolseiros que tenham contratualizado menos de 48 meses de bolsa de doutoramento. A ABIC fez notar que vários bolseiros estão a ver recusados os seus requerimentos, estando a FCT a remeter a prorrogação para um pedido de extensão da bolsa para 48 meses, considerando que a duração inicial da sua bolsa (36 meses) permite esta prorrogação adicional sem necessidade de serem abrangidos pelas bolsas excepcionais. Concordando com a posição da ABIC, o Ministro Manuel Heitor considerou que o pedido de prorrogação ordinária da bolsa é um procedimento desacoplado do requerimento para a bolsa excepcional e, como tal, esta justificação da FCT não deve poder ser tida como válida para a recusa de atribuição da bolsa excepcional. Comprometeu-se em verificar o sucedido junto da FCT e em dar uma resposta a esta questão.
Como mencionado, há quase um ano que esta situação se arrasta, deixando bolseiros sem resposta e sem capacidade de planear o seu trabalho e a sua vida. Para além das questões referidas, a ABIC reforçou igualmente que, a manterem-se os actuais 21,5% de requerimentos não aprovados, não se poderá falar de sucesso ao abordarmos este processo. Não são apenas os bolseiros com bolsa inferior a 48 meses que viram os seus requerimentos recusados, tendo havido vários casos de bolseiros que não obtiveram bolsa excepcional porque o painel de avaliação não considerou os documentos enviados ou porque exigiu documentos não referidos no Regulamento. Aliado ao atraso nas respostas, tais taxas de reprovação exigem que sejam abertos processos de reavaliação de requerimentos a todos os bolseiros que não obtiveram prorrogação ou que considerem que o período atribuído é reduzido, e vêm comprovar que a prorrogação automática de todas as bolsas (directa e indirectamente financiadas pela FCT) em 3 meses e em maior duração nos casos aplicáveis – posição desde o início defendida pela ABIC –, teria sido a única resposta atempada a ir ao encontro das reivindicações dos bolseiros.
2) Sobre o fim das taxas de entrega de tese.
A ABIC questionou o Ministro relativamente à não inscrição da promessa feita por este, em Junho de 2021, de inscrever no Orçamento do Estado para 2022 a eliminação das taxas de entrega de tese. O Ministro indicou que a proposta foi rejeitada pelo Ministério das Finanças e que, por esse motivo, não constou da proposta de Orçamento. A ABIC destacou que, mais uma vez, as promessas não foram cumpridas e que, em final de legislatura, valeria a pena o Governo fazer uma reflexão séria acerca das garantias nunca concretizadas pelo MCTES. Cabe ao Ministro da tutela assegurar que as promessas que faz são cumpridas e, como tal, não é senão de lamentar os constantes passos que o Ministério tem dado para a manutenção da desprotecção dos bolseiros de investigação. A ABIC não deixará de lutar por esta medida na nova legislatura.
3) Sobre a exigência de pagamento de propinas a bolseiras em licença de maternidade.
O Ministro afirmou tratar-se de algo inaceitável e repudiável, afirmando que vai dar orientação para que tal situação termine, nomeadamente, através de advertências directas aos Reitores e/ou Presidentes das instituições onde tais práticas ocorrem – a começar pela Universidade de Lisboa, onde a cobrança de propinas acontece em diversas faculdades e institutos. A manutenção de situações de total abuso, seja através da cobrança de legalidade duvidosa de propinas, como agora denunciado, seja pela discriminação no pagamento de subsídios de parentalidade entre bolseiros directa e indirectamente financiados pela FCT, entre inúmeros outros exemplos, é um claro indicador de como a fragilidade do vínculo de bolsa leva a um constante desrespeito por direitos constitucionalmente consagrados.
4) Sobre a queixa da ABIC e de vários bolseiros à IGEC, na sequência da não abertura de concursos no âmbito da Norma Transitória da Lei 57/2017.
Em Setembro de 2018, depois da denúncia de vários bolseiros que não viram as suas instituições abrirem concursos de forma a cumprirem a Lei 57/2017 – justificando-se argumentando que as bolsas desses colegas não eram financiadas a 100% pela FCT –, tanto a ABIC como muitos bolseiros apresentaram queixas à IGEC, na tentativa de que esta instasse as instituições a cumprir a lei. Passados mais de 3 anos, continuamos sem ter recebido qualquer notificação sobre a fiscalização da IGEC, devido à ausência de homologação por parte do MCTES. Assim, a ABIC apresentou esta situação ao Ministro que, admitindo desconhecimento sobre a falta dessa homologação, se prontificou a fazê-lo de imediato, tendo no entanto revelado que as queixas individuais dos restantes bolseiros já tinham sido por si homologadas. A ABIC espera que após esta homologação, os colegas sejam prontamente informados sobre os pareceres da IGEC e que, caso esses pareceres sejam no sentido da abertura de concursos, as instituições cumpram imediatamente a lei e as instruções das instâncias superiores.
A ABIC continuará a lutar pela dignificação da profissão, pelo fim do Estatuto do Bolseiro, pela substituição de todas as bolsas por contratos de trabalho e pela efectiva integração de todos os trabalhadores científicos nas respectivas carreiras.