In Expresso, 28 de Abril 2008
Enquanto nos países ricos a maior parte dos cientistas trabalha nas empresas, em Portugal, o grande patrão continua a ser a universidade.
Apenas 19 em cada 100 cientistas portugueses trabalham em empresas. O número é minúsculo se comparado com as economias mais ricas do planeta, como a americana (80% de investigação nas empresas) ou a alemã. Nestes países, os privados são os grandes empregadores de investigadores, contratados para desenvolverem artigos com elevado interesse para o consumidor.
De qualquer maneira, Portugal tem saltado patamares nesta matéria. Começam a surgir sinais de aproximação entre empresas e universidades e o Governo tem dado uma forte ajuda através do lançamento de políticas incentivadoras. Dentro de semanas, o ministro da Ciência vai anunciar mais um programa, destinado à contratação de investigadores por parte de companhias que actuam na área da Investigação e Desenvolvimento.
“É, de facto, bem conhecido que o desenvolvimento científico português tem sido concretizado sobretudo através da actividade de investigação nas universidades e instituições associadas onde estão concentrados os principais centros e laboratórios. Mas a actividade de I&D nas empresas tem vindo a crescer muito significativamente nos últimos dez anos”, refere ao Expresso Mariano Gago, ministro da Ciência e Ensino Superior.
A Agência de Inovação, dependente de Gago, aprovou em 2007 116 projectos empresariais de base tecnológica, 74% deles virados para o mercado mundial, que empregam 377 altos quadros.
Velhos clichés/Investidores fora do mercado
Muitos portugueses continuam, no entanto, a ter como verdade um velho cliché: quem trabalha nas universidades desenvolve teorias que pouco ou nada têm a ver com investigação aplicada. Seabra Santos, reitor de Coimbra e presidente do CRUP (órgão que reúne as universidades públicas e a Católica), e André Levy, um dos responsáveis da Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC), rejeitam que a questão seja hoje colocada dessa forma.
Seabra Santos dá o exemplo da sua instituição: “Há 20 anos que temos ligações com empresas, dezenas de empresas, e podemos falar de um êxito em 80% dos casos”. O desaparecimento da indústria tradicional da região de Coimbra, como a cerâmica e os têxteis, e a sua substituição por empresas modernas, centradas no fabrico de novos produtos e no desenvolvimento de serviços, com postos de trabalho qualificados, é a prova do casamento. O reitor sabe, contudo, que há um longo caminho a percorrer quando os exemplos são a Alemanha ou os Estados Unidos. Por um lado, economias frágeis como a portuguesa congelam investimentos empresariais em I&D, afirma Seabra Santos. Por outro, o mundo empresarial e o científico continuam a falar línguas diferentes. É por isso que dá vivas ao programa que o Governo está a preparar para as empresas empregarem cientistas. “Há 3 anos que ando a propor sabáticas de cientistas em realidades empresariais e de empresários em cenários universitários”, acrescenta.
Confrontada pelo Expresso com a realidade dos países mais ricos, André Levy, da ABIC, atribui a fraca prestação nacional à falta de tradição dos agentes económicos, à sua “formação média baixa” e à falta de capital das PME. Mas admite que alguns esforços para combater o atraso científico têm sido feitos pelas universidades, designadamente a do Minho e a de Aveiro, e pelo próprio Governo, através de programas mobilizadores.
A batalha de Portugal é idêntica à de outros países. A Comissão Europeia não se tem cansado de avisar que a competitividade se ganha através da ligação profunda entre a economia e a ciência. Que é como quem diz que quem baixar os braços será inundado por artigos americanos e chineses.
INVESTIMENTO
Investidores fora do mercado
BCP lidera ranking dos privados O Grupo BCP investiu só num ano €57 milhões em I & D, um valor que o colocou no primeiro lugar da lista de empresas que mais financiamentos fizeram em 2005 na área da investigação. Os dados resultam do Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional (IPCTN) de 2005, um trabalho feito pelo Ministério da Ciência e Ensino Superior de dois em dois anos. São 400 colaboradores que o Grupo Millennium bcp tem anualmente a trabalhar no desenvolvimento de novas soluções de comunicação tendo sempre como premissa a eficácia. Recorde-se que o maior banco privado nacional foi o primeiro a oferecer aos clientes canais alternativos aos clássicos balcões. Desde muito cedo o BCP apostou na banca telefónica e virtual. Este ano, depois de um 2007 recheado de turbulências internas e externas, o grupo deverá pôr de lado €60 milhões para investir em projectos de investigação. O grupo está a oferecer aos seus clientes condições de financiamento favoráveis à articulação entre empresas e a infra-estrutura científica. Indicadores do Ministério de Mariano Gago referem que as despesas dos privados em investigação representam 40% da fatia total. Em Espanha, a despesa dos privados já representa 59% e na Suécia, 77%.
DISSE
“Os doutorandos e os pós-doutorandos são financiados através de bolsas e não conseguem contratos de trabalho. Lá fora, a bolsa é um meio excepcional para investigar”
ANDRÉ LEVY, presdiente da ABIC
ALGUNS DADOS
37.769
Investigadores em Portugal. Mas medidos em ETI (tempo integral) são 21.126. Segundo o Eurostat, Portugal, em 2005, tinha 2 investigadores por 1000 habitantes. Em Espanha, o rácio era de 2,5, e na Finlândia de 7,5p
5,5
Cientistas por mil habitantes na população activa é o objectivo do Governo até 2009. Em 2005, Portugal tinha neste rácio 3,8 pessoas
1
por cento do PIB representa o investimento do Estado no sector em 2008. Em 1995, a despesa estatal em I&D representava 0,57% do PIB