Bolseiros de Investigação menosprezados pelo Estado
In http://www.researchcafe.net, 13 de Outubro 2005
A Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC) tem vindo a reclamar dos sucessivos Governos, a promoção do emprego científico e o reconhecimento de direitos fundamentais a todos os que desempenham uma actividade de investigação (ou conexa) na condição de bolseiro. Ao arrepio de recomendações internacionais recentes (como a Carta Europeia do Investigador), estes direitos continuam a não ser consignados na legislação nacional ou a ser desrespeitados por instituições financiadoras e de acolhimento.
A Ciência no nosso país depende crescentemente dos bolseiros de investigação, sendo estes que, cada vez mais, asseguram o normal funcionamento dos laboratórios e a execução de projectos nas instituições de investigação e desenvolvimento (I&D). Ao mesmo tempo, constata-se que apesar de uma apregoada aposta na Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) por parte dos governos mais recentes, na prática, estes não têm demonstrado suficiente interesse em contribuir para resolver os principais problemas que afectam aqueles que trabalham nestas áreas, em especial as mais novas gerações.
A ABIC vem assim, mais uma vez, a público chamar a atenção para as seguintes situações:
• Falsas bolsas: em diversas instituições nacionais as bolsas de investigação são usadas para pagar a pessoas que durante a maior parte ou a totalidade do tempo estão a preencher necessidades permanentes do serviço. Esta situação, reiteradamente denunciada pela ABIC, viola claramente o Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI) (Lei Nº 40/2004) mas continua a não ser fiscalizada nem corrigida pelos organismos competentes, como é o caso da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).
• Segurança Social: os bolseiros não são contemplados com um regime de segurança social obrigatório, podendo usufruir, se assim o desejarem, do regime de Seguro Social Voluntário que oferece uma protecção mínima, potenciando situações de grande precariedade e discriminatórias face aos restantes trabalhadores. A ABIC – na linha das recomendações mais recentes da comissão europeia – defende que os bolseiros devem ser integrados no regime geral da Segurança Social.
• Desactualização do montante das bolsas: embora sucessivos governantes reconheçam que esta é uma óbvia situação penalizadora dos bolseiros em termos financeiros, o montante das bolsas já não é actualizado há quatro anos.
• Situações de doença, maternidade e paternidade: embora se encontre actualmente consignado na lei o direito do bolseiro suspender as actividades financiadas pela bolsa por motivo de doença e maternidade (entre outros), mantendo o direito ao respectivo subsídio pelo tempo correspondente, têm sido repetidamente denunciados pelos bolseiros casos de desrespeito por este direito (inclusive pela própria FCT).
• Painel Consultivo: este painel, integrado por personalidades independentes e que deve incluir um representante de organizações representativas dos bolseiros, está previsto no EBI mas nunca foi criado. Dado que o painel tem por função acompanhar o desempenho de funções do bolseiro e fazer recomendações quer à instituição financiadora (por ex. a FCT) quer à instituição de acolhimento, consideramos que esta lacuna é um factor que propicia o desrespeito pelos direitos dos bolseiros.
Foi para debater estas e outras questões relevantes para o sistema científico e tecnológico nacional, que a ABIC solicitou há mais de meio ano uma audiência com o actual ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Prof. Mariano Gago. Todavia, não obstante os insistentes apelos feitos desde então com vista à marcação da audiência, a ABIC não recebeu qualquer resposta da parte do MCTES. Esta atitude não pode deixar de suscitar uma viva inquietação e um profundo descontentamento entre parte substancial da comunidade científica nacional, que os bolseiros hoje representam. Esperando ainda uma resposta por parte do MCTES, que demonstre coerência entre o discurso de aposta na CT&I e a prática governativa nesta área, na sua ausência, os bolseiros não deixarão de, pelos meios tidos por necessários e convenientes, tomar uma posição de força na defesa dos seus legítimos direitos e interesses e da ciência nacional.