A ABIC — Associação dos Bolseiros de Investigação Científica, a maior associação representativa de bolseiros de investigação científica e demais trabalhadores do Sistema Científico e Tecnológico Nacional (SCTN) em situação de trabalho precário e sem vínculo laboral, enviou um conjunto de onze questões a todos os partidos e/ou coligações concorrentes às legislativas de 2019.
Passamos a divulgar, por ordem de chegada, as respostas que gentilmente nos foram enviadas.
Respostas do BE – Bloco de Esquerda
- Segundo que moldes consideram que se deve projetar o financiamento do SCTN, qual a percentagem do PIB que propõem que seja alocada ao financiamento do SCTN, e como propõem zelar pela transparência e pela celeridade da atribuição de verbas?
O Bloco propõe, no seu programa, atingirmos 3% do PIB em Ciência até 2023. Essa meta é, para nós, inequivocamente, um esforço de investimento público que, só funcionará melhor se garantirmos também um novo modelo de funcionamento para a FCT. A transparência e a celeridade dependem disso.
- Que critérios estabelecem como prioritários para conceder financiamento a projetos de I&D submetidos à FCT, ou outras agências ou organismos estatais? Consideram a existência de alguma forma financiamento não orientada por projeto? Porquê?
Uma das propostas do Bloco de Esquerda assenta no seguinte princípio: “contratação de investigadores e investigadoras ao abrigo do Estatuto da Carreira de Investigação Científica através de um rácio mínimo de pessoal na carreira para aceder a financiamento estatal e/ou comunitário.”
- Qual a vossa posição sobre as recentes alterações ao Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI)?
São favoráveis à revogação deste instrumento que sempre permitiu, e sempre permitirá, o recurso à utilização de trabalho altamente qualificado sob a forma de subsídios de manutenção (bolsas) e não de contratos laborais?
As recentes alterações ao EBI são mais uma demonstração de como o Governo não só não tem coragem para mudar radicalmente o paradigma existente na Ciência como é um dos principais responsáveis pela precariedade existir como regra.
No nosso programa, uma das medidas é justamente a revogação do EBI.
- Tendo em conta a atual inexistência de uma proteção social para os bolseiros de investigação, equivalente à auferida pelos trabalhadores com contrato de trabalho, apresentam alguma proposta de melhoramento desta situação? Em que consiste?
Ao longo dos anos, temos vindo a defender melhorias nas condições de vida imediatas de todos os bolseiros. Porém, independentemente de termos defendido o fim dos cortes nos apoios a idas a congressos, na impressão da tese (etc.), o problema de fundo mantém-se e é esse que queremos resolver: tornar as bolsas contratos.
- Qual a vossa posição relativamente ao princípio defendido pelo atual Ministro da Ciência e Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) que enuncia que, enquanto um investigador se encontrar em formação, não deverá ter um contrato de trabalho? Como distinguem o conceito de formação de um investigador do conceito de formação de qualquer outro profissional?
Criticámos a posição do Ministro Manuel Heitor, não por ela estar errada na teoria, mas porque já conhecemos a prática deste Governo e de outros Governos nesta matéria. Não fazemos uma distinção como o Ministro faz.
- Qual a vossa posição sobre a necessidade, ou não, de revisão do Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU), do Estatuto Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP), do Estatuto da Carreira de Investigação Científica (ECIC), da reintrodução de categorias para não doutorados nestas carreiras, e da criação de uma carreira própria de gestão de ciência e tecnologia ou da explicitação da integração do pessoal com essas funções no ECIC?
Há uma necessidade de revisão do ECDU e ECDESP no sentido de garantir uma clarificação da figura de “docente convidado” e achamos que o problema dos BGCT pode ser resolvido dentro do ECIC.
- Qual a vossa posição sobre a real atualização dos valores remuneratórios das bolsas, outrora equiparados aos das carreiras docentes e de investigação — por exemplo, uma bolsa de doutoramento era equiparada ao salário de assistente — e congelados entre 2002 e 2018, e, consequentemente, dos valores dos contratos a termo resolutivo certo ou a termo incerto de investigadores doutorados?
Apresentámos, em todos os Orçamentos do Estado, medidas para aumentar o valor das bolsas. Algumas propostas foram aprovadas e isso significou um pequeno passo. Não é nosso objetivo principal querer essa equiparação de valores entre as bolsas e a carreiras porque nós queremos acabar com as bolsas.
- Qual a vossa posição sobre a exigência de exclusividade aos beneficiários de bolsas ao abrigo do EBI quando algumas bolsas são até inferiores ao salário mínimo nacional?
Fomos e somos contra essa exclusividade. Manifestamo-nos discordantes quando a FCT, por exemplo, decidiu comunicar a vários bolseiros que teriam, inclusive, de abandonar atividades não laborais como participar em associações ou coletivos. O direito constitucional deve prevalecer.
- Qual a vossa posição sobre a total exclusão da possibilidade de serem eleitos para vários órgãos de diversas instituições do SCTN, incluindo as de Ensino Superior, ou impossibilidade de constituírem maioria nesses órgãos, os investigadores, docentes, ou outros, que por não estarem integrados nas carreiras, embora trabalhem nessas instituições, ficam assim privados do direito fundamental de elegerem e serem eleitos?
Um dos problemas da inexistência de contrato é justamente a impossibilidade de participação na vida democrática. Não só queremos garantir isso como, paralelamente, necessitamos de rever a fundo o RJIES.
- Qual a vossa posição relativamente aos princípios contidos no Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores e na Carta Europeia do Investigador e o que propõem para que sejam cumpridos pelas instituições Portuguesas?
Temos vindo a defender que a Carta Europeia do Investigador contém um conjunto de princípios que devem ser defendidos e implementados em Portugal e que, tanto a FCT como as IES, deviam estar vinculadas a ele. Já levantámos, na Assembleia da República como no Parlamento Europeu, este problema.
- Que medidas propõem apresentar na Assembleia da República, ou a levar a cabo enquanto membros do Governo, relativamente às 10 questões anteriores?
O Bloco propõe:
Financiamento plurianual contratualizado com as instituições de ensino superior, com a contrapartida de um mecanismo avaliativo sobre implementação de políticas na melhoria da ação social escolar e do combate à precariedade. Pretende-se recuperar os valores de investimento público anteriores à intervenção da troika e convergir com o valor em percentagem de despesa pública correspondente à média da União Europeia (1,9% ou 2,3) – 150 milhões de euros por ano, até atingir os 600 milhões/ano;
Redução faseada do valor da propina máxima entre 2019/2020 e 2022/2023. Redução em cada ano do valor da propina máxima de licenciatura ou mestrado integrado em 214 euros, atingindo-se a gratuitidade da frequência do ensino superior público em 2023;
Alargamento da rede de residências universitárias e revisão do regulamento de bolsas com reformulação da fórmula de cálculo e definição de um calendário certo e regular para a transferência das bolsas;
Revisão do RJIES, recuperando o princípio da participação paritária entre corpos e de género nos órgãos de gestão e o princípio da eleição do ou da reitora/presidente por um colégio eleitoral alargado e representativo;
Revisão dos estatutos das carreiras (ECDU, ECDESP) com definição de critérios claros de avaliação de desempenho;
Valorização do Ensino Superior Politécnico, aprofundando o seu financiamento e os mecanismos de ação social, garantindo efetivamente a possibilidade destas instituições ministrarem doutoramentos e reforçando a sua capacidade na área da investigação científica;
Atingir na legislatura 3% do PIB em investimento em ciência e investigação;
Alteração do modelo de funcionamento da FCT, através da contratação de pessoal especializado, mais autonomia na decisão e ação e melhor ligação com o setor científico;
Revogação do Estatuto de Bolseiro de Investigação Científica para todas as tarefas não formativas e obrigatoriedade de contratação de investigadores e investigadoras ao abrigo do Estatuto da Carreira de Investigação Científica através de um rácio mínimo de pessoal na carreira para aceder a financiamento estatal e/ou comunitário.
Respostas do PCP – Partido Comunista Português
- Segundo que moldes consideram que se deve projetar o financiamento do SCTN, qual a percentagem do PIB que propõem que seja alocada ao financiamento do SCTN, e como propõem zelar pela transparência e pela celeridade da atribuição de verbas?
O financiamento do SCTN tem-se pautado pelo estrangulamento financeiro crónico; pela excessiva centralização na Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), cujos concursos (para financiamento de projectos, unidades de investigação e recursos humanos) são irregulares, imprevisíveis e marcados pela falta de transparência; e pela excessiva dependência de fontes de financiamento e orientações externas (em particular da União Europeia. Esta situação tem promovido a precariedade laboral, a degradação e obsolescência das condições materiais, o encerramento de unidades de investigação e a crescente volatilidade das condições de trabalho.
O Decreto-Lei n.o 63/2019, a chamada Lei da Ciência, prossegue uma linha de subordinação da produção científica e tecnológica à lógica de “mercado” — prosseguida já pelo anterior Governo PSD/CDS — valorizando a intervenção privada e legitimando a privatização de serviços públicos, designadamente ao nível do regime fundacional e das instituições privadas sem fins lucrativos, assim como uma clara aposta modelos do tipo parceria público-privada (PPP) para a Ciência. Para o PCP, ciência é um bem público e deve ser estimulada através de financiamento público, não limitando linhas de investigação, mas antes abrindo perspetivas de desenvolvimento económico e social, assegurando simultaneamente o cumprimento integral dos direitos dos trabalhadores e o combate à precariedade.
Exige-se assim a definição de uma política nacional de C&T que atenda às necessidades e especificidades nacionais, consagrando a intervenção da Assembleia da República na elaboração das políticas de C&T e no acompanhamento da sua execução. Exige-se também que o financiamento público adquira uma componente nacional estável e substancial, independente das verbas provenientes dos Programas-Quadro de Investigação da UE. Diga-se aliás que Portugal tem sido contribuinte líquido para estes programas, condição que não parece provável que venha a ser significativamente alterada no próximo Horizonte Europa (2021 – 2027) que prevê uma redução da fracção dos fundos objecto de gestão partilhada e aumento do financiamento competitivo, algo que mereceu a firme oposição dos deputados do PCP no Parlamento Europeu.
A transparência e celeridade de atribuição de verbas exige uma reforma de fundo da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (ou mesmo a sua extinção), que se tem distinguido por uma actuação autocrática a que importa urgentemente pôr fim, reformando objectivos e métodos de trabalho — incluindo a divulgação pública anual dos respectivos relatórios e contas, e a transparência dos júris de avaliação — e inaugurando outras formas de atribuição e gestão de fundos para a I&D, nomeadamente uma real autonomia administrativa e financeira das unidades e instituições executoras de I&D, incluindo a contratação de pessoal;
O programa da CDU aponta para um significativo reforço do financiamento público — a duplicação do investimento por investigador ETI no sector público, até o final da próxima legislatura — com forte investimento no recrutamento e formação de técnicos, auxiliares e investigadores, assim como nas condições físicas e materiais dos centros de investigação. Um investimento público estrutural que ofereça condições de estabilidade e qualidade à execução de programas de C&T. Propomos também a redução da taxa do IVA para aquisição de bens e serviços no âmbito de projectos de investigação.
No que toca ao financiamento em C&T pelas empresas, propomos a criação de um Fundo para a Inovação Tecnológica Empresarial financiado por empresas na proporção de 1% do respectivo VAB acima de 5 milhões de euros de volume de negócios anual, com co-gestão e co-financiamento públicos; a criação de uma Agência para o Desenvolvimento e Transferência de Tecnologias que promova e facilite a transferência para o tecido produtivo das descobertas e inovações dos Centros de Investigação; e a criação de um Programa Nacional de parcerias para actividades de investigação aplicada e de inovação de produtos e processos a executar por Micro, Pequenas e Médias Empresas, mediante a negociação de contratos de projecto entre empresas e instituições públicas de I&DE, com metas e prazos definidos e com financiamento público a fundo perdido.
- Que critérios estabelecem como prioritários para conceder financiamento a projetos de I&D submetidos à FCT, ou outras agências ou organismos estatais? Consideram a existência de alguma forma financiamento não orientada por projeto? Porquê?
O PCP defende o aumento do financiamento estatal das instituições do Ensino Superior Público via Orçamento do Estado, para níveis compatíveis com a sua missão, bem como a alteração da Lei de Financiamento, com base nas propostas que tem sucessivamente apresentado na Assembleia da República e que têm sido sucessivamente rejeitadas por PS, PSD e CDS, mais recentemente a proposta para Financiamento do Ensino Superior Público (Projeto de Lei n.o 811/XIII).
O PCP defende que as Instituições do Ensino Superior devem ser dotadas de verbas no OE que assegurem o regular funcionamento das instituições e centros de investigação público, em termos das suas necessidades permanentes de recursos humanos e materiais, e o desenvolvimento de uma política própria de investigação científica, sem prejuízo da existência de concursos de financiamento para projectos. O financiamento de projectos deverá ser complementar, sem colocar em causa a estabilidade laboral dos recursos humanos ou a continuidade operacional. A política científica deve assumir como objetivo maior o aperfeiçoamento e o reforço da capacidade científica das unidades de I&D existentes, de acordo com os méritos comprovados e a pluralidade de domínios de conhecimento no mundo contemporâneo.
- Qual a vossa posição sobre as recentes alterações ao Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI)?
As recentes alterações ao EBI (Decreto-Lei n.o 123/2019) foram publicadas sem que o Governo as tenha discutido e apresentado às instituições de Ensino Superior ou às organizações representantes de bolseiros, como a ABIC, e num período de final de legislatura, quando o plenário da Assembleia da República havia interrompido os seus trabalhos. E mais uma vez, a forma apressada e unilateral de proceder cria dúvidas e confusão nas instituições na hora de implementação das novas normas.
Embora estas alterações restrinjam a tipologia e duração de bolsas, admitem ainda a sua existência e possível abuso por parte das instituições. Sobretudo, estas alterações são insuficientes para resolver o problema de funda da precariedade dos trabalhadores científicos, na medida em que não dá resposta à sua necessária contratação. Os mecanismos no domínio do emprego científico nesta legislatura foram largamente insuficientes tendo sido marcados pelo boicote preconizado pelas instituições de ensino superior de demais instituições científicas (i.e., laboratórios de Estado) e pelos entraves e atrasos impostos por parte do Governo para a integração efectiva dos trabalhadores nas respectivas carreiras.
Entendemos que só a revogação do Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI) e a substituição de todas as bolsas por contratos, conjuntamente com a valorização da integração nas Carreiras, podem resolver de vez o problema da precariedade na ciência. Neste sentido o PCP tem levado constantemente à discussão na Assembleia da República a proposta de revogação do EBI e a criação do Regime jurídico da contratação do pessoal de investigação científica.
- Tendo em conta a atual inexistência de uma proteção social para os bolseiros de investigação, equivalente à auferida pelos trabalhadores com contrato de trabalho, apresentam alguma proposta de melhoramento desta situação? Em que consiste?
Embora defendendo a revogação do EBI e a contratação dos actuais bolseiros como melhor forma de melhoramento da condição laboral destes trabalhadores, o grupo parlamentar do PCP na Assembleia da República vem há várias legislaturas lutando pela melhoria das condições dos bolseiros sob o presente estatuto, incluindo a actualização dos montantes das bolsas e que os bolseiros beneficiem das mesmas regalias em termos de segurança social que os trabalhadores da instituição que integram.
- Qual a vossa posição relativamente ao princípio defendido pelo atual Ministro da Ciência e Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) que enuncia que, enquanto um investigador se encontrar em formação, não deverá ter um contrato de trabalho? Como distinguem o conceito de formação de um investigador do conceito de formação de qualquer outro profissional?
O PCP assume que a esmagadora maioria dos actuais bolseiros são objetivamente trabalhadores por conta de outrem. Tendo em conta que estes trabalhadores científicos produzem efetivamente trabalho, imaterial e material, é da mais elementar justiça que lhes seja garantido um contrato, com estatuto legal de natureza jurídico-laboral, independentemente do estádio da carreira em que se encontre, para que possa usufruir dos direitos que resultam da existência de um contrato de trabalho, incluindo o direito à segurança social.
A formação é uma componente intrínseca ao longo da carreira de um trabalhador científico, como como para diversas outras profissões. Alguns períodos terão maior foco na obtenção de novas competências. Não obstante, esses períodos de formação, na sua maioria, são efectuados através da realização de trabalho científico. Como tal, sempre que seja realizado trabalho, ainda que no âmbito de formação ou obtenção de um grau, a condição de trabalhador deve ser reconhecida e implicar um contrato de trabalho.
Esta posição encontra-se traduzida na proposta de Regime jurídico da contratação do pessoal de investigação científica em formação (Projeto de Lei n.o 131/XIII/1.a) que o PCP apresentou na Assembleia da República, já em 2014.
- Qual a vossa posição sobre a necessidade, ou não, de revisão do Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU), do Estatuto Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP), do Estatuto da Carreira de Investigação Científica (ECIC), da reintrodução de categorias para não doutorados nestas carreiras, e da criação de uma carreira própria de gestão de ciência e tecnologia ou da explicitação da integração do pessoal com essas funções no ECIC?
A revogação do EBI deve ser acompanhada do reforço, valorização e dignificação das Carreiras supramencionadas, incluindo sua revisão, como por exemplo reintroduzindo as categorias de Estagiário e Assistente de Investigação no ECIC, como categorias de formação de pessoal investigador; e a valorização dos diversos trabalhadores da Ciência, com a aprovação de carreiras específicas, incluindo a criação de Carreiras Técnicas de Apoio à Investigação, abertas a candidatos que possuam desde a escolaridade obrigatória até ao grau de doutor; e para os actuais BGCTs. No início deste ano, o PCP apresentou o Projecto de Resolução N.o 1358/XIII Contratação e integração dos Bolseiros de Gestão de Ciência e Tecnologia reconhecendo que estes bolseiros realizam tarefas permanentes e necessárias das unidades de investigação e da própria Fundação para a Ciência e a Tecnologia, e propondo-se um processo com vista à criação de carreira especial para estes trabalhadores.
- Qual a vossa posição sobre a real atualização dos valores remuneratórios das bolsas, outrora equiparados aos das carreiras docentes e de investigação — por exemplo, uma bolsa de doutoramento era equiparada ao salário de assistente — e congelados entre 2002 e 2018, e, consequentemente, dos valores dos contratos a termo resolutivo certo ou a termo incerto de investigadores doutorados?
A condição de bolseiro limita limita objetivamente muitos direitos que deviam estar à partida assegurados a estes trabalhadores, entre os quais o direito a um salário justo. Por isso, o PCP defende e tem proposto que deve ocorrer a integração progressiva na carreira de investigação científica de todos os bolseiros de investigação que satisfaçam necessidades permanentes das instituições. Até que esta integração seja uma realidade, o PCP considera que é necessário dar resposta aos problemas concretos vividos pelos bolseiros, nomeadamente o valor das bolsas e os benefícios auferidos.
Durante 16 anos, estes trabalhadores não viram qualquer aumento das suas bolsas, havendo mesmo bolseiros a ganhar abaixo do salário mínimo nacional. O aumento que ocorreu por via do Orçamento do Estado de 2018 destinou-se unicamente a bolseiros de doutoramento, abrangendo uma minoria dos bolseiros e excluindo as bolsas mais baixas, nomeadamente as Bolsas de Iniciação Científica (€385) ou as de Técnico de Investigação (€565 e €745). A actualização então aprovada, com base no índice de preços ao consumidor, não contemplou qualquer aumento extraordinário perante a perda do poder de compra sentida desde a última atualização de bolsas: mais de 25%. Assim, o aumento afectou apenas alguns bolseiros e de forma manifestamente insuficiente.
Por essa razão, PCP tem vindo a propor uma atualização anual na medida mínima dos aumentos previstos para todos os trabalhadores da Administração Pública, ocorrendo ainda uma atualização extraordinária para elevação dos valores das bolsas face ao facto de já não existir qualquer aumento desde 2002. De referir ainda que o PCP se tem batido pelo descongelamento das progressões remuneratórias na carreira , incluindo dos professores do Ensino Superior Pública.
- Qual a vossa posição sobre a exigência de exclusividade aos beneficiários de bolsas ao abrigo do EBI quando algumas bolsas são até inferiores ao salário mínimo nacional?
A exclusividade dos bolseiros é uma exigência injusta, impedindo que os bolseiros possam exercer outras actividades remuneradas sem prejuízo da realização do seu plano de trabalho, actividades que podem ser relevantes para o enriquecimento de conhecimentos e competências, desenvolvimento de projectos empresariais e integração no mundo do trabalho. Esta exigência é particularmente grave quando algumas bolsas são manifestamente suficientes para o sustento pessoal. Recorde-se que em algumas carreiras a possibilidade de exclusividade vem associada a um reforço salarial, sendo que no caso das bolsas essa opção não existe e os níveis salariais estiveram congelados durante cerca de 16 anos. Mas a exclusividade bem sendo usada mesmo para actividades não remuneradas, como se viu durante esta legislatura, no caso de bolseiros que no âmbito do seu trabalho associativo participaram na organização de congressos. O PCP questionou o governo o abuso interpretativo do regime de dedicação exclusiva, que descreveu como atentado ao direito de livre associação do bolseiro e invasão da sua vida privada, direitos consagrados na Constituição.
- Qual a vossa posição sobre a total exclusão da possibilidade de serem eleitos para vários órgãos de diversas instituições do SCTN, incluindo as de Ensino Superior, ou impossibilidade de constituírem maioria nesses órgãos, os investigadores, docentes, ou outros, que por não estarem integrados nas carreiras, embora trabalhem nessas instituições, ficam assim privados do direito fundamental de elegerem e serem eleitos?
A não-representação de largas camadas de trabalhadores científicos em situação precária é bem demonstrativo do actual défice democrático ao nível do Ensino Superior e SCTN como um todo. Tão pouco a necessária contratação destes trabalhadores dará resposta adequada a este défice, pois este assenta nas modelos de gestão implementadas pelo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES) — incluindo a transformação das Universidades em Fundações Públicas de Direito Privado — , no recurso às Instituições Privadas Sem Fins Lucrativos, e Regime Jurídico das Instituições de I&D.
O PCP tem lutado pela revogação do RJIES e o Regime Fundacional nas Instituições de Ensino Superior, e por uma verdadeira gestão democrática das Instituições de Ensino Superior Público e garantir a participação e a gestão democrática das instituições, de acordo com a Constituição da República, envolvendo docentes, investigadores, estudantes e funcionários. Nesse sentido, apresentou na AR, no início deste ano, o Projecto de Lei N.º 1145/XIII Revoga o regime fundacional e estabelece um modelo de gestão democrática das instituições públicas de ensino superior.
- Qual a vossa posição relativamente aos princípios contidos no Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores e na Carta Europeia do Investigador e o que propõem para que sejam cumpridos pelas instituições Portuguesas?
O PCP partilha das recomendações contidas da Carta Europeia dos Investigadores e do Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores. Em primeiro lugar, a exigência da sua aplicação deve ser feita junto do governos e instituições de ensino superior e investigação em Portugal. A transformação da Carta e do Código em directiva resultará, necessariamente, na aplicação de sanções da UE aos Estados-membros, medidas contra as quais o PCP luta diariamente em defesa da soberania do País. De resto, e tendo em conta a especificidades da UE, consideramos que é o facto de a Carta e o Código de Conduta não ser vinculativos que permite a sua redacção, caso contrário, dificilmente essa redacção resultaria num texto tão positivo. Assistimos a uma contradição evidente entre uma recomendação adoptada por diversas instituições do Sistema Científico e Tecnológico Nacional e uma prática muito distante dela, o que tem de ser denunciado. Acresce a realidade de subjugação de uma estratégia governativa para o Sistema Científico e Tecnológico Nacional, no domínio científico, às directivas europeias, quando deveria ser a realidade nacional a ditar essa mesma estratégia.
O PCP tem vindo a defender a transformação de cada bolsa em contrato de trabalho, independentemente do grau de formação do trabalhador, posição que continuaremos a defender activamente na luta ao lado dos trabalhadores de ciência. Assumimos o compromisso de diálogo com a ABIC, associação cujo trabalho desenvolvido consideramos fundamental na defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores de ciência e a qual temos auscultado com frequência em matéria de precariedade laboral e de realidade do SCTN.
- Que medidas propõem apresentar na Assembleia da República, ou a levar a cabo enquanto membros do Governo, relativamente às 10 questões anteriores?
O PCP tem já um longo trabalho de propostas apresentadas na Assembleia da República que vão encontro das medidas apontadas no nosso Programa eleitoral, algumas das quais já indicadas nas respostas anteriores.
Abaixo listamos as propostas que constam do Programa Eleitoral do PCP que tocam estas matérias:
- Inverter o ciclo de subfinanciamento do Ensino Superior público, através de nova Lei do Financiamento, garantindo às instituições de ensino e investigação o orçamento necessário ao desenvolvimento das suas actividades e consagrar o fim do pagamento de propinas para todos os graus académicos e assegurar, simultaneamente, a existência das condições materiais e humanas adequadas ao funcionamento das instituições.
- Duplicar, até ao final da legislatura, o investimento por investigador ETI no sector público.
- Recrutar 10 mil técnicos e auxiliares de apoio à investigação.
- Introduzir uma taxa reduzida de IVA para as aquisições de bens e serviços no âmbito de projectos de investigação e a adequação das normas da contratação pública.
- Definir uma política estratégica de Ciência & Tecnologia que atenda às necessidades e especificidades económicas e sociais do País.
- Repensar a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e exigir, por exemplo, a divulgação pública anual dos seus respectivos relatórios e contas.
- Revogar o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior (RJIES) e garantir um quadro legal que valorize o papel do Ensino Superior Público no desenvolvimento económico, social e territorial e revogar o Regime Fundacional nas Instituições de Ensino Superior.
- Consagrar uma verdadeira gestão democrática das Instituições de Ensino Superior Público e garantir a participação e a gestão democrática das instituições, de acordo com a Constituição da República, envolvendo docentes, investigadores, estudantes e funcionários.
- Revogar o Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI) e substituí-lo por contratos de trabalho e combater todas as formas de precariedade, procedendo à integração de todos os trabalhadores que suprem necessidades permanentes, incluindo os ‘falsos’ professores convidados e bolseiros, assegurando o respeito pelas carreiras dos trabalhadores das Instituições de Ensino Superior e, designadamente, do direito à progressão, e criando novas carreiras especiais quando necessário.
Respostas do PSD – Partido Social Democrata
- Segundo que moldes consideram que se deve projetar o financiamento do SCTN, qual a percentagem do PIB que propõem que seja alocada ao financiamento do SCTN, e como propõem zelar pela transparência e pela celeridade da atribuição de verbas?
Acreditamos ser de enorme importância para o país o desenvolvimento de políticas públicas que fomentem o investimento público e privado nas três áreas do chamado triângulo do conhecimento: Ensino Superior, Ciência e Inovação. Acompanhamos o valor de referência de 5% do P.I.B., que tem sido avançado pela Comissão Europeia para o investimento nestas três áreas, e entendemos que Portugal deverá ter como meta alcançar este patamar até 2030. O aumento do investimento público será suportado essencialmente por fundos regionais (FEDER, FSE) e outros fundos europeus competitivos, além do necessário reforço do investimento por via do orçamento do Estado. Concordamos com a necessidade de evoluir para um modelo de financiamento mais coerente e transparente, mais estável e de maior dimensão. Consideramos também relevante criar condições facilitadoras para as instituições, nomeadamente em termos de modelos de gestão e de organização, de forma a potenciar a captação de financiamento público competitivo e investimento privado.
- Que critérios estabelecem como prioritários para conceder financiamento a projetos de I&D submetidos à FCT, ou outras agências ou organismos estatais? Consideram a existência de alguma forma financiamento não orientada por projeto? Porquê?
Os critérios devem ser a excelência e o impacto dos projetos. O financiamento deve ser individual, por projeto e por instituição, como é prática em todo o mundo. No âmbito da referida necessidade de reforçar a coerência e transparência dos procedimentos, propomo-nos avançar para um modelo de financiamento desenvolvido com os parceiros, assente na qualidade e na meritocracia, cujos critérios sejam reconhecidos e aceites por todos.
- Qual a vossa posição sobre as recentes alterações ao Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI)?
Temos de ter bolsas para estudantes de doutoramento. No entanto, tudo o que é trabalho regulado de investigação não deve ser coberto por essas bolsas. Esse trabalho deve ser objeto de contratos a termo ou ser feito pelos quadros das instituições. A bolsa tem um papel importante, mas deve ser restringida ao período de formação.
- Tendo em conta a atual inexistência de uma proteção social para os bolseiros de investigação, equivalente à auferida pelos trabalhadores com contrato de trabalho, apresentam alguma proposta de melhoramento desta situação? Em que consiste?
Existe uma lei de agosto de 2003, apresentada pelo grupo parlamentar do PSD e aprovada na Assembleia da República, que assegura para os bolseiros de investigação um leque alargado de mecanismos de proteção social. Com a saída do governo de então (PSD/CDS-PP), o referido diploma nunca chegou a ser regulamentado. No que depender do PSD, os princípios já defendidos em 2003 serão, com as adaptações que eventualmente se verifique serem necessárias, um ponto de partida para as medidas a adotar nesta área.
- Qual a vossa posição relativamente ao princípio defendido pelo atual Ministro da Ciência e Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) que enuncia que, enquanto um investigador se encontrar em formação, não deverá ter um contrato de trabalho? Como distinguem o conceito de formação de um investigador do conceito de formação de qualquer outro profissional?
O período de formação de um investigador tem caraterísticas marcadamente distintas em relação a outras carreiras profissionais. Mais do que enunciá-las uma a uma, remetemos a resposta para o Charter of the Research Career, documento da Comissão Europeia que explica de forma esclarecedora de que forma deve ser construída uma carreira de investigação, e que subscrevemos por inteiro.
- Qual a vossa posição sobre a necessidade, ou não, de revisão do Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU), do Estatuto Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP), do Estatuto da Carreira de Investigação Científica (ECIC), da reintrodução de categorias para não doutorados nestas carreiras, e da criação de uma carreira própria de gestão de ciência e tecnologia ou da explicitação da integração do pessoal com essas funções no ECIC?
É intenção do PSD promover um amplo debate e rever os diversos estatutos da carreira docente e de investigador para as instituições de ensino superior. A ideia de partida é a criação de um único estatuto, embora com perfis bem diferenciados, oferecendo respostas para as estratégias de carreira dos colaboradores e as necessidades das instituições.
- Qual a vossa posição sobre a real atualização dos valores remuneratórios das bolsas, outrora equiparados aos das carreiras docentes e de investigação — por exemplo, uma bolsa de doutoramento era equiparada ao salário de assistente — e congelados entre 2002 e 2018, e, consequentemente, dos valores dos contratos a termo resolutivo certo ou a termo incerto de investigadores doutorados?
Tal como já foi referido em diversas ocasiões pelo presidente do partido, Rui Rio, quer se tratem de carreiras docentes do ensino superior e de investigação, quer estejam em causa os professores do ensino básico e secundário, o PSD é por princípio favorável à justa atualização de todas as remunerações e ao reconhecimento de todo o tempo de serviço efetivamente prestado, tendo sempre presente o critério da sustentabilidade das contas públicas..
- Qual a vossa posição sobre a exigência de exclusividade aos beneficiários de bolsas ao abrigo do EBI quando algumas bolsas são até inferiores ao salário mínimo nacional?
As bolsas devem ter um valor razoável. Não é aceitável que possam ser inferiores ao Salário Mínimo Nacional. Não se deve exigir exclusividade, mas deve exigir-se que o trabalho desempenhado por esses bolseiros seja relevante para a bolsa. Por exemplo, dar aulas ou fazer um certo número de horas de trabalho de investigação remunerado, pode ser útil para a carreira de um investigador. E valoriza o seu currículo.
- Qual a vossa posição sobre a total exclusão da possibilidade de serem eleitos para vários órgãos de diversas instituições do SCTN, incluindo as de Ensino Superior, ou impossibilidade de constituírem maioria nesses órgãos, os investigadores, docentes, ou outros, que por não estarem integrados nas carreiras, embora trabalhem nessas instituições, ficam assim privados do direito fundamental de elegerem e serem eleitos?
Entendemos que a forma de governação das instituições está desatualizada. É rígida, pouco transparente e pouco participativa. Por princípio, devem ter-se em conta todas as pessoas que trabalham nas instituições. A questão de poderem ser ou não eleitos para os órgãos das instituições está aberta a debate. Mas seguramente devem poder participar.
- Qual a vossa posição relativamente aos princípios contidos no Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores e na Carta Europeia do Investigador e o que propõem para que sejam cumpridos pelas instituições Portuguesas?
Deve incentivar-se as instituições a seguirem esses dois documentos. Há algumas questões nos mesmos que tocam na autonomia das instituições, mas, de uma forma geral, a nossa recomendação é para que se respeitem esses documentos.
- Que medidas propõem apresentar na Assembleia da República, ou a levar a cabo enquanto membros do Governo, relativamente às 10 questões anteriores?
Todas as medidas que foram anunciadas atrás e muitas outras que constam do documento: “Ensino Superior – Uma Estratégia para a Década” serão apresentadas pelo PSD no princípio da próxima legislatura, seja no Governo ou na Assembleia da República.
Respostas do LIVRE
- Segundo que moldes consideram que se deve projetar o financiamento do SCTN, qual a percentagem do PIB que propõem que seja alocada ao financiamento do SCTN, e como propõem zelar pela transparência e pela celeridade da atribuição de verbas?
O financiamento do SCTN deveria cumprir as metas de investimento em investigação desenvolvimento (I&D) declaradas como objetivo para Portugal em 2020, correspondentes a uma intensidade em I&D (DIDE/PIB) entre 2,7% e 3,3%, dos quais 1,0% a 1,2% no sector público e 1,7% a 2,1% no sector privado. Para tal é necessário aumentar a taxa de execução em I&D nas Universidades e Politécnicos públicos, na formação avançada e Emprego Científico, para se atingir o valor mínimo de 1% do PIB em 2020.
As instituições do SCTN devem ser financiadas de forma estável e transparente, através de financiamento público num regime plurianual e contratualizado por objetivos. O financiamento deve assentar numa fórmula baseada em indicadores de estrutura e de desempenho, destinada a suportar as despesas de funcionamento e infraestrutura, com dotações atribuídas por concurso, destinado a implementar projetos e estratégias locais alinhadas com o perfil institucional e com as necessidades de desenvolvimento do país e da região.
- Que critérios estabelecem como prioritários para conceder financiamento a projetos de I&D submetidos à FCT, ou outras agências ou organismos estatais? Consideram a existência de alguma forma financiamento não orientada por projeto? Porquê?
É fundamental que existam financiamentos não orientados por projeto, para além dos financiamentos orientados por projeto, para que se consiga consolidar a infraestrutura de I&D em PT e promover o emprego científico e a estabilidade do SCTN.
As instituições de investigação de referência, como os Laboratórios Associados, com capacidade de resposta a nível nacional e Internacional, em cooperação com entidades de referência internacional, e que prestem apoio às políticas públicas nas suas áreas de competência devem ser financiadas no âmbito de contratos programa específicos com duração de médio prazo. O reconhecimento destas instituições deve ser feito no âmbito de um regulamento claro e as instituições devem, durante o contrato programa, ser sujeitas a acompanhamento próximo e periódico pela FCT.
- Qual a vossa posição sobre as recentes alterações ao Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI)?
Propomos rever o Estatuto do Bolseiro de Investigação limitando a atribuição de bolsas a um máximo de dois anos(*) para trabalhos de investigação tendentes à obtenção de graus académicos e a um ano para trabalhos de investigação e formação avançada de pós-doutoramento ou para outras atividades de investigação e desenvolvimento tecnológico com caráter de iniciação. Para períodos superiores devem ser celebrados contratos a termo, de forma a que os doutorandos e os investigadores em formação avançada, ou em atualização, se vejam reconhecidos como trabalhadores de facto durante a maior parte do período da sua formação especializada, usufruindo dos mesmos direitos laborais que os restantes trabalhadores.
(*) No caso dos trabalhos de investigação para obtenção de grau de doutoramento, a proposta de manutenção de bolsas durante os dois primeiros anos prende-se com a parte escolar decorrer durante esse período, assim como com a existência de pelo menos uma avaliação intermédia sobre o estado dos trabalhos de doutoramento ao fim dos dois primeiros anos. Após essa avaliação intermédia, deverá ser celebrado um contrato de trabalho com termo fixo até ao final do doutoramento.
- Tendo em conta a atual inexistência de uma proteção social para os bolseiros de investigação, equivalente à auferida pelos trabalhadores com contrato de trabalho, apresentam alguma proposta de melhoramento desta situação? Em que consiste?
Como referido na resposta anterior, propomos que para períodos superiores a 2 anos nos casos de trabalhos de doutoramento e 1 ano, nos casos de pós-doutoramento, sejam celebrados contratos de trabalho de forma a que os doutorandos e os investigadores e as suas entidades contratantes descontem para a segurança social como os demais trabalhadores.
- Qual a vossa posição relativamente ao princípio defendido pelo atual Ministro da Ciência e Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) que enuncia que, enquanto um investigador se encontrar em formação, não deverá ter um contrato de trabalho? Como distinguem o conceito de formação de um investigador do conceito de formação de qualquer outro profissional?
Distinguimos aqui apenas o período inicial de doutoramento durante o qual o doutorando ainda frequenta a componente escolar do doutoramento e se encontra numa fase inicial de definição e de consolidação de conhecimentos para a tese. No restante tempo consideramos que os doutorandos devem ter contratos de trabalho.
Quanto a bolsas de iniciação à investigação e de pós-doutoramento, de que um estudante ou investigador possa por exemplo usufruir no âmbito de programas de mobilidade ou de formação específica e intensiva, consideramos que devem ter a duração máxima de 1 ano. Nos restantes casos, consideramos que um investigador se encontra em formação ao longo de toda a vida e que essa não é uma razão válida para não se celebrar um contrato de trabalho.
- Qual a vossa posição sobre a necessidade, ou não, de revisão do Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU), do Estatuto Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP), do Estatuto da Carreira de Investigação Científica (ECIC), da reintrodução de categorias para não doutorados nestas carreiras, e da criação de uma carreira própria de gestão de ciência e tecnologia ou da explicitação da integração do pessoal com essas funções no ECIC?
Somos favoráveis à revisão de estatutos da ECDU e ECPDESP e da ECIC. Propomos equiparar as carreiras de docência e investigação, através da revisão do Estatuto da Carreira de Investigação Científica (ECIC) para que seja equiparado em nível de exigência, direitos e deveres ao Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU) e ao Estatuto do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP). A integração de ambas as carreiras num mesmo estatuto deverá incluir a possibilidade de mobilidade periódica entre as carreiras de investigação e docente, dentro da mesma instituição ou entre instituições diferentes, permitindo uma melhor gestão dos recursos e necessidades das instituições.
A carreira de gestão de Ciência e Tecnologia não deve em princípio ser definida pelos estatutos de Carreira de Pessoal Investigador e Docente.
- Qual a vossa posição sobre a real atualização dos valores remuneratórios das bolsas, outrora equiparados aos das carreiras docentes e de investigação — por exemplo, uma bolsa de doutoramento era equiparada ao salário de assistente — e congelados entre 2002 e 2018, e, consequentemente, dos valores dos contratos a termo resolutivo certo ou a termo incerto de investigadores doutorados?
Consideramos que no caso das bolsas deve haver equiparação de valores líquidos correspondentes ao grau de formação do bolseiro, após ter sido sido descontada a fração relativa ao valor do seguro social voluntário.
- Qual a vossa posição sobre a exigência de exclusividade aos beneficiários de bolsas ao abrigo do EBI quando algumas bolsas são até inferiores ao salário mínimo nacional?
As bolsas são apoios à formação avançada; logo a obrigação da exclusividade não faz sentido.
- Qual a vossa posição sobre a total exclusão da possibilidade de serem eleitos para vários órgãos de diversas instituições do SCTN, incluindo as de Ensino Superior, ou impossibilidade de constituírem maioria nesses órgãos, os investigadores, docentes, ou outros, que por não estarem integrados nas carreiras, embora trabalhem nessas instituições, ficam assim privados do direito fundamental de elegerem e serem eleitos?
Para o LIVRE é uma violação do nosso conceito de Democracia as pessoas não poderem ter voz sobre as decisões que as afetam ou não poderem eleger os seus representantes.
- Qual a vossa posição relativamente aos princípios contidos no Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores e na Carta Europeia do Investigador e o que propõem para que sejam cumpridos pelas instituições Portuguesas?
Concordamos plenamente com os princípios contidos no Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores e na Carta Europeia do Investigador e entendemos que devem ser cumpridos em Portugal.
- Que medidas propõem apresentar na Assembleia da República, ou a levar a cabo enquanto membros do Governo, relativamente às 10 questões anteriores?
No nosso programa às Eleições Legislativas propomos um conjunto de medidas relativas à ciência e ao ensino superior que disponibilizamos abaixo:
Ensino superior
As instituições do ensino superior devem ter uma verdadeira autonomia, reger-se por princípio de participação democrática, funcionar em rede com outras instituições nacionais e internacionais e apoiar o desenvolvimento social, económico, ambiental e cultural das regiões em que se localizam. Em paralelo, é fundamental criar condições para que mais pessoas frequentem e concluam com sucesso estudos superiores, independentemente da sua localização, condição socioeconómica e etapa de vida. Para ultrapassar os desafios que as alterações inevitáveis que o mercado de trabalho tem vindo a sofrer e que serão mais evidentes com a crescente automação dos mecanismos de produção e com a “internet das coisas”, é necessário dar um grande impulso à formação superior, democratizando verdadeiramente o acesso ao Ensino Superior, não só alargando as oportunidades de acesso para jovens que terminam o ensino secundário, mas também promovendo a formação superior ao longo da vida.
Mas para isso é preciso garantir a dignidade do trabalho docente e científico, que estão fortemente relacionados. Em Portugal, o crescimento do setor de Investigação e Desenvolvimento (I&D), desde o início dos anos 80, foi baseado na figura do “bolseiro de investigação”, que tem vindo a ser substituído progressivamente, mas de forma irregular, por investigadores com contratos a prazo. Por outro lado, as vagas de acesso à carreira universitária têm sofrido congelamentos e as progressões nas carreiras têm sido muito limitadas. A pouca previsibilidade na abertura de vagas no ensino superior e nas unidades de investigação para contratações a mais longo termo têm tornado as perspectivas de carreiras incertas, o que as faz pouco atrativas e tem resultado em “fuga de cérebros”. Estes são profissionais que fazem falta para o reforço e democratização do ensino superior, sendo urgente assegurar estabilidade nas contratações e condições de trabalho competitivas num mercado de trabalho que é global. A integração, a estabilidade e a formação contínua destes profissionais são fundamentais para a coesão intergeracional e a renovação das instituições, assim como para assegurar a qualidade dos programas de formação e de investigação e para aumentar as qualificações dos portugueses, retendo conhecimento e capacidade no país.
Para concretizar esta visão defendemos:
- Eliminar as propinas no 1º ciclo e regulamentar o valor das propinas relativas ao 2ºciclo e à formação pós-graduada através do estabelecimento de tetos máximos e da preparação de um processo de redução progressiva do seu montante, de acordo com padrões europeus.
- Rever os mecanismos de atribuição de apoios sociais diretos e indiretos aos estudantes, eliminando os constrangimentos e as assimetrias das normas atuais, devendo os apoios aos estudantes ser atribuídos independentemente da situação de dívida do seu agregado familiar à segurança social ou à autoridade tributária. O valor mínimo da bolsa de estudo deve ser ponderado a partir de indicadores de custo de vida ajustados localmente. O alojamento estudantil deve ser promovido em articulação entre IES e o poder local, no quadro de políticas de habitação jovem e de revitalização dos centros urbanos.
- Requalificar a população ativa de nível pós-secundário através da criação de um programa que estabeleça parcerias entre instituições do ensino superior, empresas e agências da administração pública, para adequar o seu perfil formativo aos desafios de uma economia avançada e promover a sua empregabilidade.
- Financiar as instituições do ensino superior de forma estável e transparente, através de financiamento público num regime plurianual e contratualizado por objetivos. O financiamento deve assentar numa fórmula baseada em indicadores de estrutura e de desempenho, destinada a suportar as despesas de funcionamento e infraestrutura, com dotações atribuídas por concurso, destinado a implementar projetos e estratégias locais alinhadas com o perfil institucional e com as necessidades de desenvolvimento do país e da região.
- Internacionalizar as instituições do ensino superior, facilitando a atração de estudantes internacionais, reforçando os programas de financiamento de períodos de mobilidade estudantil e docente no ensino superior, de duração variável, através de fontes de financiamento públicas e parcerias do Estado com o setor empresarial.
- Equiparar as carreiras de docência e investigação, através da revisão do Estatuto da Carreira de Investigação Científica (ECIC) para que seja equiparado em nível de exigência, direitos e deveres ao Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU) e ao Estatuto do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (ECPDESP). A integração de ambas as carreiras num mesmo estatuto deverá incluir a possibilidade de mobilidade entre as carreiras de investigação e docente, dentro da mesma instituição ou entre instituições diferentes, permitindo uma melhor gestão dos recursos e necessidades das instituições.
- Rever o Estatuto do Bolseiro de Investigação limitando a atribuição de bolsas a um máximo de dois anos para trabalhos de investigação tendentes à obtenção de graus académicos e a um ano para trabalhos de investigação e formação avançada de pós-doutoramento ou para outras atividades de investigação e desenvolvimento tecnológico com caráter de iniciação. Para períodos superiores devem ser celebrados contratos a termo, de forma a que os estudantes de doutoramento e os investigadores em formação avançada ou em atualização se vejam reconhecidos como trabalhadores de facto durante a maior parte do período da sua formação especializada, usufruindo dos mesmos direitos laborais que os restantes trabalhadores. 8. Abrir lugares no quadro das instituições públicas, desbloqueando a abertura dos concursos de contratação de docentes, investigadores e técnicos, de modo a satisfazer as necessidades das instituições e restituir a qualidade do seu trabalho, combatendo a prática recorrente de utilizar trabalhadores precários para responder a necessidades permanentes.
- Assegurar a igualdade de direitos no ensino superior público, particular e cooperativo, através da adoção pelas instituições de ensino particular e cooperativo dos estatutos da carreira docente, garantindo a democracia interna e a liberdade de ensino e investigação e reforçando as garantias de representação sindical nestas instituições.
Ciência – Queremos pôr o sistema científico ao serviço da democracia e do desenvolvimento.
A ciência é um requisito para o desenvolvimento tecnológico, social e económico de um país e um pilar fundamental de uma sociedade sustentável. Portugal caracteriza-se por um défice histórico neste campo, combatido desde 1995 com o investimento na formação de recursos humanos e na internacionalização que resultou no desenvolvimento das instituições de I&D e num saldo positivo inegável nos indicadores de produção científica e na crescente qualificação de uma nova geração de portugueses. Esta trajetória foi interrompida em 2011, resultando num desperdício avassalador de recursos e num enorme entrave à competitividade do país. Para que este desinvestimento não se repita, é fundamental garantir uma estratégia de financiamento público em ciência e I&D que seja independente de ciclos políticos e/ou macroeconómicos, garantindo-se financiamentos plurianuais e regras transparentes, que promovam a estabilidade, a confiança e a articulação com as estratégias de desenvolvimento local, nacional e europeu. Esta estratégia deve assumir que o investimento em ciência não se traduz necessariamente em crescimento económico a curto prazo e que o apoio à investigação fundamental não pode ser adiado ou diminuído em tempos difíceis na expectativa de que o investimento em investigação aplicada traga melhores resultados económicos.
Por isso defendemos:
- Cumprir as metas de investimento em investigação e desenvolvimento (I&D) declaradas como objetivo para Portugal em 2020, correspondentes a uma intensidade em I&D (DIDE/PIB) entre 2,7% e 3,3%, dos quais 1,0% a 1,2% no sector público e 1,7% a 2,1% no sector privado. Para tal é necessário aumentar a taxa de execução em I&D nas Universidades e Politécnicos públicos, na formação avançada e Emprego Científico, para se atingir o valor mínimo de 1% do PIB em 2020. Em 2018 o valor atingido na execução global em I&D foi de 1.37% do PIB, valor que se encontra em lenta recuperação depois do mínimo de 1.24% em 2015, principalmente devido ao aumento de execução no setor privado para 0.7% do PIB em 2018, ao passo que o setor público mantém níveis de execução de 2015, de cerca de 0.67% do PIB.
- Estabilizar o sistema científico, definindo em conjunto com os intervenientes do setor um novo modelo de governação para a Fundação para a Ciência e Tecnologia, que lhe garanta maior autonomia e permita desenhar planos plurianuais com níveis de financiamento global e por áreas, numa lógica de planeamento estratégico de médio prazo. Os concursos para bolsas, projetos e criação de emprego científico devem ocorrer anualmente em datas fixas, com critérios transparentes e com conhecimento da composição dos júris.
- Pôr a ciência ao serviço das instituições públicas e das comunidades através da contratação de bens e serviços (por exemplo, estudos, projetos, assessorias, auditorias, consultorias, serviços técnicos e desenvolvimento de produtos) por parte da administração pública e setor empresarial do Estado às instituições do ensino superior e unidades do sistema científico nacional.
- Promover a investigação interdisciplinar em áreas estratégicas, como por exemplo na área da saúde, da sustentabilidade dos ecossistemas e na mitigação dos efeitos das alterações climáticas, estabelecendo programas em conjunto com as empresas e a administração pública de forma a criar condições para a aceleração da aplicação de novas tecnologias junto da sociedade. Este é um dos usos possíveis para os instrumentos financeiros de apoio da União Europeia a instituições públicas, colocando em prática processos de contratação pública que promovam a inovação e investigação de novas soluções que possam responder aos desafios existentes, como é o caso dos contratos pré-comerciais (PCP – Pre Comercial Procurement) e a contratação pública de soluções inovadoras (public procurement for innovation solutions).
- Estabelecer um regime de isenção ou de reembolso do IVA – hoje cobrado a 23% – pelos bens e serviços necessários aos projetos científicos que correspondam a atividades de investigação e desenvolvimento comprovadamente sem fins lucrativos. A Ciência deve ser vista como uma atividade fundamental para a sociedade e para o desenvolvimento do país e não como uma atividade comercial, estando hoje os cientistas que desenvolvem investigação em Portugal em desvantagem face a grande parte seus colegas europeus.
- Valorizar o potencial económico do conhecimento dinamizando e apoiando a participação de empresas portuguesas em projetos de investigação financiados pela União Europeia. As entidades do sistema científico e tecnológico devem investir na constituição, formação e profissionalização de pessoal dedicado à transferência de conhecimento e à propriedade intelectual nas entidades públicas, munindo-as de competências para proteger e comercializar conhecimento produzido e para negociar parcerias nos mercados mundiais.
- Democratizar a ciência e monitorizar a literacia científica através de uma Plataforma Nacional para a Literacia Científica responsável por monitorizar e promover um programa de promoção das competências científicas da população.
Todo o programa do LIVRE pode ser consultado em www.partidolivre.pt