No passado dia 6 de junho, a ABIC teve uma reunião com a nova presidência da FCT, Doutora Helena Pereira, e vice-presidência, Doutor José Paulo Esperança, para entregar o seu novo Caderno Reivindicativo, dando conta de alguns dos seus pontos, e discutir vários problemas e queixas que têm sido feitos chegar à ABIC.
A reunião foi cordial e muito agradecemos à FCT ter-nos recebido e ter estado disponível para responder aos pontos apresentados. Evidentemente que a ABIC continua a divergir da FCT, e MCTES/Governo, em questões de base e que se prendem com a definição e direitos dos trabalhadores científicos. Por um lado, na questão fundamental da revogação do Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI) – entendemos que, enquanto o EBI não for revogado, as bolsas serão o principal instrumento utilizado pelas instituições. Por outro, ABIC e FCT divergem na questão da consideração dos mestrandos e doutorandos enquanto estudantes e não enquanto trabalhadores científicos, o que lhes nega o direito a um contrato de trabalho e, por conseguinte, todo um conjunto de direitos sociais. Ainda que discordando da existência de bolsas de investigação para fins de trabalho científico, a ABIC não deixou de reforçar que o diminuto aumento dos valores das bolsas que ocorreu em 2018, para as Bolsas de Doutoramento (BDs) isoladamente, e em 2019, para a generalidade das bolsas, não compensou de forma alguma os dezassete anos seguidos sem qualquer atualização.
Quanto a questões, problemas e queixas mais concretas, resumimos o mais relevante:
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- A questão do Provedor do Bolseiro: a FCT voltou a reconhecer que houve problemas com o anterior Provedor no que diz respeito ao acesso deste aos pedidos que lhe foram dirigidos, referindo que um novo Provedor será anunciado em breve.
- Sobre o carácter abusivo da minuta de exclusividade do Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI): a FCT esclareceu que a questão dos limites ao associativismo está resolvida no seguimento da anterior denúncia da ABIC e que esta já não se coloca, mantendo-se, porém, os outros limites a atividades laborais e demais atividades que possam interferir com o plano de trabalhos.
- Sobre o recente desfasamento entre os valores das BDs e das Bolsas de Investigação para Mestre: a FCT esclarece que tal resultou de um processo legislativo não tendo a FCT agenciamento sobre alterações à tabela remuneratória.
- Sobre a continuação da “contratação” de Bolseiros de Investigação (BI) por projectos: a FCT reafirmou que as bolsas não associadas à atribuição do grau académico de Mestre ou Doutor também não vão acabar. Acabarão, sim, os concursos nacionais de Bolsas de Pós-Doutoramento (BPD), apostando a FCT no estímulo à contratação. Este é um dado particularmente infeliz, visto que as bolsas não conferentes de grau são um exemplo claro de trabalho não formativo que deveria estar associado a contratos de trabalho – e não só no que se refere a bolsas para doutorados.
- Sobre as BPDs do concurso de 2016 e a recente declaração do MCTES de manutenção das BPDs por um período máximo de 3 anos: a FCT esclareceu que para as BPDs 2016, e outras anteriores ainda ativas resultantes de concursos individuais, se aplica o regulamento vigente no período da candidatura, pelo que continuam a poder ser renovadas até um máximo de 6 anos.
- Sobre os pedidos de renovação de BPDs para o 2º triénio quando na candidatura os projetos não tinham sido planeados para 72 meses mas apenas para 36 meses: a FCT esclareceu que é um problema recorrente que levanta muitas questões, dado que os projetos de candidatura são avaliados também tendo em consideração a sua duração. Não obstante, decidiram tratar todos os processos em igualdade de circunstâncias (os que pediram para 3 anos e os que pediram para 6 anos no momento da candidatura), procedendo à apreciação dos pedidos. A FCT poderá ainda proceder à renovação condicional de 1 ano e voltar a avaliar.
- Sobre os pedidos de renovação das BDs quando os projectos foram pedidos para 3 e não para 4 anos: para haver renovação deverá existir justificação científica. A ABIC volta a reiterar que, no momento das candidaturas e de definição da duração das bolsas, os bolseiros deverão considerar estas questões de política científica.
- Sobre os problemas decorrentes do atraso no pagamento de algumas BDs: a ABIC voltou a referir que, para além do problema fulcral do bolseiro ter o seu subsídio/vencimento em atraso, muitos outros problemas, como o de propinas incorrectamente imputadas e exigidas aos bolseiros pelas instituições, se poderiam resolver rapidamente se não existissem atrasos nos pagamentos por parte da FCT. A FCT atribuiu responsabilidades às instituições de acolhimento e/ou os próprios bolseiros que lhes fazem chegar os documentos com atraso. Ainda que casos deste tipo possam existir, está ainda por demonstrar que a FCT não engrossa as fileiras da responsabilidade no processo.
- Sobre candidaturas a novos concursos com pedidos de recursos a decorrer: a FCT esclareceu que nenhum dos processos prejudica o outro e que são independentes, pelo que ninguém fica privado de poder concorrer a um por estar a decorrer o outro.
- Sobre os direitos básicos dos bolseiros: a ABIC referiu que, ainda que o objectivo seja a revogação do EBI, enquanto o não é, direitos semelhantes aos previstos no Código do Trabalho deveriam ser dados aos bolseiros e que tal deveria ser integrado em qualquer revisão futura do EBI — por exemplo, na questão da parentalidade, ainda que esteja prevista licença paga, não estão previstas necessidades pré- e pós-licença (e.g. consultas pré-natais e redução de horário para aleitamento). A FCT concordou que estes direitos não podem ficar na dependência da “boa vontade” dos orientadores/coordenadores, e tomou nota do pedido. No entanto, a ABIC não deixa de reforçar que estes problemas só se resolveriam com a integração dos BIs num sistema pleno de Segurança Social com atribuição de contratos de trabalho, observando no entanto com pesar que as soluções avançadas pela FCT não direcionam para este caminho.
- Sobre a possibilidade de mudança de instituição nos concursos CEEC-Individual: a ABIC questionou a FCT sobre a possibilidade de mudança institucional de contratos de investigador pelo CEEC-Individual, visto que por vezes se esgotam os recursos relativos a um dado projecto ou existe alguma perda de atualidade ou pertinência deste durante o enorme período temporal entre a candidatura e a saída dos resultados. A FCT foi peremptória na impossibilidade de mudança de instituição com a qual se estabeleceu o contrato-programa, mas aceita que o contratado negocie ajustes/alterações ao projecto mediante fundamentação.
- Sobre os Concursos da Norma Transitória do DL57 não abertos até 31 agosto 2018: a FCT diz que esses concursos têm de ser abertos e os contratos têm que ser celebrados mas que, ultrapassado o 31 de agosto de 2018, o pagamento desses contratos não está na alçada da FCT e só pode ser resolvido pelo MCTES/Governo ou pela Assembleia da República (AR). A ABIC sublinha contudo que a resolução dos problemas deveria passar por um sistema de forças em que FCT, MCTES e demais Governo têm um papel e agem em conjunto e complemento. No entanto, nota que cada actor não assume as suas competências para resolver o problemas e se demite do seu papel, remetendo para os tribunais ou para a AR o solucionamento dos casos. A informar ainda que a ABIC fez uma queixa à Inspecção Geral da Educação e Ciência (IGEC) em setembro de 2018, atualizada em dezembro de 2018, aguardando ainda resposta a este processo.
- Sobre os Concursos da Norma Transitória do DL57 na FCUL: a FCT refere que o atraso no início dos contratos se deve a razões relacionadas com a redacção, mas que terão início em Julho de 2019. Estão ainda sinalizadas instituições em que os contratos estão assinados mas onde os investigadores não estão em efectividade de funções também por questões relacionadas com as respectivas instituições. Mais uma vez, a existência de forças não alinhadas compromete a situação.
- Sobre a não abertura de concursos financiáveis pela FCT sob a Norma Transitória do DL57 e em Laboratórios do Estado: a FCT remeteu para a resposta anterior e, deste modo, tal só poderá ser resolvido judicialmente e/ou pelo MCTES/Governo ou pela AR.
- Sobre os Laboratórios do Estado como instituições de acolhimento: a ABIC questionou a FCT se os Laboratórios de Estados poderiam vir a ser instituições de acolhimento nos CEEC-Individuais futuros. Não obtendo uma resposta clara e imediata da FCT, esta não descarta essa hipótese mediante consulta e revisão dos regulamentos, sugerindo, porém, que o CEEC-Institucional é a opção mais interessante para essas instituições devido à integração na carreira.
- Sobre a revisão dos estatutos das carreiras de investigação (ECIC) e de docência (ECDU): esta discussão e revisão deverá acontecer no próximo mandato. A FCT concordou com a ABIC que a questão das carreiras de investigação e de docência carecem de maior discussão com os interessados.
- Sobre a eventual recusa de bolsas de concursos nacionais por parte dos candidatos vencedores: a FCT pediu que os bolseiros que não pretendem ficar com as bolsas informem a FCT de forma a que a mesma possa transitar para outro bolseiro, procedimento que, a ser por “repescagem” dos candidatos não financiados, será uma novidade.
- Sobre a avaliação das unidades I&D e as 400 BDs previstas no início da legislatura: a FCT informou que os resultados deveriam ser conhecidos em Julho, tendo de se considerar ainda o período de Audiência Prévia. Nesse sentido, relativamente às BDs a serem atribuídas no âmbito das unidades I&D, não deverão haver condições para os concursos serem abertos antes no início do ano lectivo 2019/2020. Os resultados (parciais) deste concurso foram entretanto revelados.
- Sobre a existência de um calendário plurianual FCT: a FCT refere que, por questões de definição orçamental anual, é impossível fazer uma calendarização a longo prazo dos concursos e oportunidades. No entanto, em determinadas áreas previstas, é possível fazer uma calendarização mais prolongada (e.g. programas de financiamento na investigação sobre combate a incêndios). Fica por clarificar se alguma ação neste sentido foi tentada, ou se se aproveita o actual formato geral de financiamento público para não tentar outras soluções..
Após a reunião, a ABIC deixa a nota que muito foi falado e discutido, e até prometido, mas é necessário que as coisas se concretizem (por exemplo, desde a reunião, ainda não há notícias do novo Provedor do Bolseiro, tendo o mesmo problema sido já apontado pela ABIC à FCT na reunião de 2018).
Sabemos de antemão que muito há para discutir e para transformar. .Para isso é também necessário que todos os intervenientes no sistema científico e tecnológico nacional assumam um papel activo – não só os governantes mas também os trabalhadores científicos, a quem cabe o papel fundamental de ação e reivindicação.