Ser bolseiro de investigação é uma “incerteza constante”

Ser bolseiro de investigação é uma “incerteza constante”

In Jornalismo e Ciências da Comunicação Porto, 17 de Julho 2007

Queixam-se da fal­ta de pro­tec­ção so­ci­al e de pers­pec­ti­vas quan­to ao fu­tu­ro. Para mui­tos in­ves­ti­ga­do­res, ru­mar ao es­tran­gei­ro não é uma von­ta­de, mas uma inevitabilidade. 

Com 33 anos, José Gomes é bol­sei­ro de in­ves­ti­ga­ção ci­en­tí­fi­ca des­de que aca­bou a li­cen­ci­a­tu­ra. Actualmente, re­ce­be uma bol­sa de pós-dou­to­ra­men­to e faz in­ves­ti­ga­ção no de­par­ta­men­to de Química da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP). É um dos in­ves­ti­ga­do­res que vai pro­tes­tar es­ta quar­ta-fei­ra fren­te à rei­to­ria da uni­ver­si­da­de con­tra a si­tu­a­ção em que os bol­sei­ros se encontram.

É uma “in­cer­te­za cons­tan­te”, con­ta ao JPN o in­ves­ti­ga­dor de quí­mi­ca com­pu­ta­ci­o­nal. A bol­sa que o li­ga à FCUP aca­ba em Janeiro do pró­xi­mo ano e na­da es­tá ga­ran­ti­do pa­ra os tem­pos que se se­guem. Um con­tra­to co­mo in­ves­ti­ga­dor ou co­mo do­cen­te do en­si­no su­pe­ri­or é “bas­tan­te com­pli­ca­do”, reconhece.

São cer­ca de 10 mil os bol­sei­ros de in­ves­ti­ga­ção ci­en­tí­fi­ca em Portugal. As crí­ti­cas ao ac­tu­al es­ta­tu­to do bol­sei­ro são an­ti­gas e co­nhe­ci­das: dei­xa de fo­ra os in­ves­ti­ga­do­res do sis­te­ma de se­gu­ran­ça so­ci­al, não ga­ran­tin­do aces­so ao sub­sí­dio de de­sem­pre­go, e tem si­do usa­do abu­si­va­men­te, na opi­nião da Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC), pe­las ins­ti­tui­ções pa­ra pre­en­cher la­cu­nas dos qua­dros de pessoal.

Em Setembro ter­mi­na a bol­sa de pós-dou­to­ra­men­to de André Levy, pre­si­den­te da ABIC, ac­tu­al­men­te no Instituto Superior de Psicologia Aplicada, em Lisboa. Aos 35 anos, la­men­ta-se de não ter “pers­pec­ti­vas, in­clu­si­va­men­te da ren­ta­bi­li­za­ção dos anos de ex­pe­ri­ên­cia”. “É di­fí­cil man­ter a an­si­e­da­de so­bre con­tro­lo pa­ra re­a­li­zar o tra­ba­lho”, confessa.

”É muito mais fácil sair daqui”

Bolseira há se­te anos, Joana Marques pro­cu­ra co­nhe­cer as cau­sas ge­né­ti­cas pa­ra a in­fer­ti­li­da­de. O ob­jec­ti­vo nes­te mo­men­to é con­cluir o dou­to­ra­men­to na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e par­tir pa­ra um pós-dou­to­ra­men­to a mei­as en­tre Portugal e ou­tro país. 

“Gostava de fi­car aqui em Portugal e de con­tri­buir pa­ra o avan­ço ci­en­tí­fi­co do país”, diz, re­co­nhe­cen­do que “é mui­to mais fá­cil sair da­qui”. Daí que mui­tos seus co­le­gas emi­grem e não vol­tem. “O sec­tor pú­bli­co con­ge­lou e as em­pre­sas não que­rem in­ves­tir em dou­to­ra­dos”, argumenta.

“Há fac­to­res de ex­pul­são em Portugal”, re­fe­re André Levy, que, ape­sar de que­rer fi­car em Portugal, lem­bra que “to­dos aque­les que pre­ten­der mes­mo se­guir a car­rei­ra ci­en­tí­fi­ca” têm que man­ter a pos­si­bi­li­da­de de ir pa­ra o estrangeiro.

Não é só nas ci­ên­ci­as exac­tas que abun­dam o nú­me­ro de tra­ba­lha­do­res em si­tu­a­ção pre­cá­ria. Com 25 anos, João Queirós, que par­ti­ci­pa num pro­jec­to de in­ves­ti­ga­ção so­bre trans­for­ma­ções so­ci­o­ló­gi­cas no no­ro­es­te por­tu­guês na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, re­fe­re que os pro­ble­mas dos bol­sei­ros são os mes­mos nas ci­ên­ci­as so­ci­ais, “se ca­lhar com a agra­van­te de ha­ver me­nos bol­sas” e, por­tan­to, me­nos cer­te­zas ain­da quan­to ao futuro.