Bolseiros criticam condições de trabalho previstas por estatuto

Bolseiros cri­ti­cam con­di­ções de tra­ba­lho pre­vis­tas por estatuto

 In Público/​Lusa, 20 de Janeiro 2003

    A Plataforma de Bolseiros de Investigação Científica (PBIC) la­men­ta que as su­as rei­vin­di­ca­ções so­bre a me­lho­ria das con­di­ções de tra­ba­lho e do seu es­ta­tu­to ain­da não te­nham si­do re­sol­vi­das. O pre­si­den­te da Fundação pa­ra a Ciência e Tecnologia (FCT) re­ba­teu as crí­ti­cas la­men­tan­do que os bol­sei­ros en­ca­rem o es­ta­tu­to co­mo “uma pro­fis­são”.
    Em Julho de 2002, a PBIC (que reú­ne cer­ca de 4000 bol­sei­ros da FCT e de ou­tras ins­ti­tui­ções) apre­sen­tou um ca­der­no rei­vin­di­ca­ti­vo – te­cen­do crí­ti­cas ao es­ta­tu­to que ori­en­ta a sua ac­ti­vi­da­de – à Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura. Nele, re­cla­ma­vam o di­rei­to à se­gu­ran­ça so­ci­al com in­te­gra­ção no re­gi­me ge­ral, o re­co­nhe­ci­men­to le­gal do di­rei­to a fé­ri­as e o di­rei­to ao sub­sí­dio de de­sem­pre­go. Além dis­so, era pe­di­da a pro­gres­si­va equi­pa­ra­ção do mon­tan­te das bol­sas às re­mu­ne­ra­ções dos tra­ba­lha­do­res com ha­bi­li­ta­ções equi­pa­ra­das.
    Equiparação aos res­tan­tes tra­ba­lha­do­res no usu­fru­to de to­dos os sub­sí­di­os es­ta­be­le­ci­dos por lei, con­ta­gem do pe­río­do de du­ra­ção da bol­sa pa­ra efei­tos de re­for­ma e con­cur­sos pú­bli­cos, al­te­ra­ção do re­gi­me de ex­clu­si­vi­da­de, fis­ca­li­za­ção re­gu­lar por par­te das en­ti­da­des com­pe­ten­tes e aber­tu­ra de va­gas nas car­rei­ras, que per­mi­tam a in­te­gra­ção con­tí­nua e pro­gres­si­va de pes­so­al com di­fe­ren­tes ní­veis de ha­bi­li­ta­ções, são ou­tras das rei­vin­di­ca­ções.
    João Ferreira, da PBIC e bió­lo­go do Jardim Botânico da Universidade de Lisboa, la­men­tou a ine­xis­tên­cia de “re­sul­ta­dos prá­ti­cos em re­la­ção ao que era pre­ten­di­do com o do­cu­men­to, no­me­a­da­men­te no que diz res­pei­to à al­te­ra­ção dos es­ta­tu­tos”.
    Por seu la­do, Fernando Ramôa Ribeiro, pre­si­den­te da FCT, re­ba­teu ho­je as crí­ti­cas dos bol­sei­ros, la­men­tan­do que es­tes en­ca­rem o es­ta­tu­to co­mo “uma pro­fis­são”, es­que­cen­do as empresas.

    “Todos os pro­jec­tos as­si­na­dos pe­la Fundação es­tão a ser cum­pri­dos”, dis­se o pre­si­den­te da FCT, que já se reu­niu com os bol­sei­ros da PBIC.
    Reconhecendo que “exis­tem as­pec­tos a me­lho­rar na si­tu­a­ção dos bol­sei­ros”, e su­bli­nhan­do es­tar aber­to ao diá­lo­go, Ramôa Ribeiro cri­ti­cou que es­tes “não se abram à so­ci­e­da­de, adop­tan­do uma men­ta­li­da­de de fun­ci­o­ná­ri­os pú­bli­cos”.
    “Em vez de pen­sa­rem em fi­car nos Laboratórios de Estado, on­de a con­ten­ção nas ad­mis­sões vai im­pe­dir qual­quer en­tra­da na Função Pública, os dou­to­res e pós-dou­to­ra­dos de­vi­am pen­sar em ser ad­mi­ti­dos pe­las em­pre­sas”, fri­sou.
    Ramôa Ribeiro la­men­tou que “mui­tos des­tes bol­sei­ros pa­re­çam des­cu­rar a ver­ten­te de trans­fe­ren­cia de tec­no­lo­gia”. Até por­que, dis­se, “ser bol­sei­ro não é pro­fis­são, é uma fa­se transitória”.

    Comentários dos lei­to­res (20/​1/​03)
    É pre­ci­so ter vergonha 

    O se­nhor di­rec­tor da FCT afir­ma que os bol­sei­ros de­vem pro­cu­rar em­pre­go após o fim da bol­sa em em­pre­sas. Mas a per­gun­ta que se faz é: quais em­pre­sas? Em Portugal não exis­te ne­nhum ti­po de em­pre­sas ca­paz de em­pre­gar os bol­sei­ros por­tu­gue­ses por­que na mai­or par­te dos ca­sos es­tes têm qua­li­fi­ca­ções a mais pa­ra os lu­ga­res a ocu­par e os em­pre­sá­ri­os não em­pre­gam os dou­to­ra­dos por­que es­tes sig­ni­fi­cam sa­lá­ri­os mais ele­va­dos e lo­go mais des­pe­sas. A úni­ca res­pos­ta só po­de ser ir pa­ra o es­tran­gei­ro o que sig­ni­fi­ca­ria um des­per­di­çar do di­nhei­ro pú­bli­co in­ves­ti­do nes­tes ci­da­dãos que na mai­or par­te dos ca­sos que­rem es­tar em Portugal não só por ra­zões de ca­rác­ter pri­va­do e fa­mi­li­ar mas tam­bém por­que es­tes que­rem dar al­go ao país.     Se o Estado em vez de dar mi­lhões de eu­ros de fi­nan­ci­a­men­to e re­ga­li­as fis­cais às mul­ti­na­ci­o­nais pa­ra vi­rem pa­ra Portugal, e de­pois irem-se em­bo­ra após um par de anos dei­xan­do cen­te­nas de pes­so­as no de­sem­pre­go, sub­si­di­as­se e des­se a es­tas pes­so­as con­di­ções pa­ra a cri­a­ção de em­pre­sas tec­no­ló­gi­cas em que pu­des­sem em­pre­gar os co­nhe­ci­men­tos por eles de­sen­vol­vi­dos nos seus pro­jec­tos de in­ves­ti­ga­ção, tal­vez es­te pro­ble­ma não se pu­ses­se. Senhores di­ri­gen­tes, va­mos a ser mais res­pon­sá­veis e co­me­çar a ter vi­sões de mé­dio e lon­go pra­zo e a apos­tar nos por­tu­gue­ses em vez de an­dar­mos a dar di­nhei­ro a ex­plo­ra­do­res sem es­crú­pu­los.
Marco António Campinho (Faro)